março 31, 2004

Tindersticks, de novo


No dia 16 de Abril, no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, às 21 horas actuam os Tindersticks, num espectáculo inserido no programa GALP LOUNGE. Não há, até agora, mais informações, apenas se sabe que é o único concerto deles agendado para este ano e que vão apresentar o último album. Sabe-se também o preço do bilhete, 20 Euros, preço único. Seja como for, vou de certeza estar lá. Vamos?


março 30, 2004

25


Não partas já.Fica até onde a noite se dobra
para o lado da cama e o silêncio recorta
as margens do tempo.É aí que os livros
começam devagar e as cores nos cegam
e as mãos fazem de norte na viagem.Parte apenas

quando amanhã se ferir nos espelhos do quarto
em estilhaços de luz;e um feixe de poeiras
rasgar as janelas como uma ave desabrida.
Alguém murmurará então o teu nome,vagamente,
como a gastar os dedos na derradeira página.

E então,sim,parte,para que outra história se
invente mais tarde,quando os pássaros gritarem
à primeira lua e os gatos se deitarem sobre
o muro,de olhos acesos,fingindo que perguntam.


Maria do Rosário Pedreira
de A Casa e o Cheiro dos Livros(1996), Quetzal Editores

um presente... de Marcia Maia


versos de circunstância

duas xícaras sobre mesa
uma cheia outra de café vazia

três colheres de açúcar na lembrança
um saquinho de adoçante

e um cheiro de ausência misturado
ao de torradas na cozinha.


Márcia Maia


março 19, 2004

Tonino Guerra




Ana, seria esta a disposição dos livros?

"O tempo nunca existiu, o tempo é nossa invenção"

Jorge Palma - Eternamente Tu





Foi o que me aconteceu semana, o tempo parece que não existiu e hoje já é sexta feira.
Vou inventar um fim de semana diferente.





março 17, 2004

As tuas palavras 1


É no nevoeiro que melhor percebo o sol.

março 12, 2004

Nossas mãos assemelham-se tanto a cidades destruídas


Também assim os versos
caem perto do que esquecemos e arrastam
a mil anos de distância
esta espécie de uivo
este grito de veludo escondido em nós
(...)
nossas mãos
assemelham-se tanto a cidades destruídas
(...)

Mário Rui de Oliveira, Bairro Judaico, Assírio & Alvim

março 11, 2004

Luto


Em Espanha, hoje todas as bandeiras estão a meia haste. Nós também estamos de luto.

Madrid, 11 de Março de 2004


Cabrões.

março 10, 2004

31


Aqui tenho sonhos que não conto a ninguém.

Maria do Rosário Pedreira em A Casa e o Cheiro dos Livros

março 08, 2004

Isto anda mesmo tudo ligado


Na sua última crónica no suplemento Mil Folhas do jornal Público, a Ana fala-nos do Tonino Guerra e do(s) Tarkovski:

(...)Tenho aqui a fotografia da capela dedicada a Tarkovski, feita por Tonino; lembro-me de "Il libro delle chiese abbandonate" (e como é bela a capa do livro, um pastel do autor, como são belas todas as capas destes livros). Há uma pequena igreja abandonada, sem tecto, dentro da qual cresce uma cerejeira. Em Abril surgem as flores, depois os frutos, que são comidos pelos melros e pelos pássaros selvagens. Quando alguém entra naquele espaço e reza, e uma das folhas cai, a graça é concedida. Mas Andrei Tarkovski, que tinha um pedido muito grande a fazer, passou ali em Novembro, e as folhas já tinham caído todas. Tarkovski e Tonino Guerra trabalharam juntos no argumento de "Nostalghia". Há poucos meses Tonino disse-me para rever o filme, porque tinha a ver com a nossa história, e com o fresco que ele encontrou num mosteiro da Rússia, o fresco no qual os anjos desdobravam os céus no princípio dos tempos. (...)

Por seu lado Tonino Guerra diz isto do seu amigo:

As folhas da cerejeira
A André Tarkovsky
Por cima de Casteldeci há uma igreja sem tecto e as paredes têm entre os braços uma cerejeira que cresceu no chão e cujos ramos tocam o céu.
Em Abril floresce e a brancura desliza da árvore até ao fundo do vale, depois nascem os frutos e comem-nos os melros e os pássaros bravos; entretanto as folhas ficam vermelhas e uma de cada vez caem ao chão.
Se alguém assoma àquelas paredes com o desejo de pedir um milagre e há uma folha que cai nesse momento é sinal que de lá de cima terá uma resposta boa.
Tarkovsky passou lá em Novembro e precisava de fazer um pedido grande, mas as folhas já tinham caído todas e serviam de cama a duas ovelhas que dormiam.


No mesmo suplemento, mas noutro texto, Ana fala-nos do poeta Mário Rui de Oliveira que por sua vez traduziu Tonino Guerra (Histórias para Uma Noite de Calmaria e O Mel) e que fala de Giacometti e Mark Rothko, sempre recorrentes nos textos da Ana:

Em estado puro
Numa das esculturas de Giacometti, tocadas ainda de fogo, um homem caminha, em movimento solitário e eterno. Não sabemos se entra, se sai da morte, mas conseguimos reconhecer, na nobreza do cobre, a própria condição humana. Como benção ou danação, o escultor devolve- nos a vida em estado puro. Viver é também isso. Percorrer um campo de anémonas, quase com vergonha do que trazemos escondido, na mão.

Mark Rothko
Mede a tapeçaria como quem entra no santuário e quebra o espelho de uma ausência. Suas cores são um milagre. De púrpura violácea, de púrpura escarlate, de púrpura carmesin.


Realmente isto anda mesmo tudo ligado, ou como diz o próprio Mário Um amigo é uma história que nos salva.

Poesia no Eléctrico


Lido no Mil Folhas do jornal Público de 06-03-2004:

"Chama-se "Poesia em Linha" a iniciativa que hoje é lançada pelo Museu do Carro Eléctrico, pela Sociedade de Transportes Colectivos do Porto e pela Fundação Eugénio de Andrade (FEA), no Porto. Trata-se de uma série de cinco viagens "poéticas" a bordo de um velho carro eléctrico entre a FEA, na Foz do Douro, e a Igreja de S. Francisco, no Largo do Infante (ida e volta). Durante o percurso, de cerca de hora e meia, os passageiros serão brindados com os versos de vários poetas portugueses, lidos pelo actores João Paulo Costa e Cláudia Silva. A primeira viagem realiza-se esta tarde, a partir das 17h. As próximas realizam-se nos sábados seguintes, até 3 de Abril. O bilhete custa 8 euros."

março 05, 2004

Subsídios precisam-se!


Há uma coisa que me intriga, ou que me surpreende, de há uns tempos para cá, nos inquéritos das revistas ditas literárias ou suplementos de jornais: normalmente quando perguntam a escritores, ou jornalistas que publicaram livros, a forma como eles arrumam os seus livros, todos eles têm respostas bastante diferentes e originais. Estantes, sofás, debaixo da cama, mesa do escritório, empilhados no chão, por côres, assuntos, país de origem, etc. Só há uma coisa em comum a todos eles: parece que existem mais livros do que espaço disponível lá por casa. Ora, isto é dito exactamente por quem diz também que não se vive da literatura em Portugal (nem do jornalismo, pelo menos do escrito, da imprensa), ou dito de outra forma (talvez mais correcta) não se vive da literatura em Portugal. De que outra forma justificar então a quantidade enorme de livros espalhados pelas casas destes nóbeis araútos da cultura Portuguesa? Quem tem comprado livros ultimamente sabe do que falo, os preços são incriveis, em comparação com os ordenados da maior parte dos Portugueses.
Isto vem a propósito da seguinte situação: no outro dia, na livraria Bertrand, aguardava a minha vez para pagar. À minha frente um senhor na casa dos quarenta anos, barba rala e cabelos grisalhos, magro, empilhava no balcão um monte considerável de livros. Contei-os, eram 11. Dos que consegui ver havia uma edição do Perfume, de Patrick Suskind, uma do A Mancha Humana de Philip Roth, um do Alçada Batista e outro do Lobo Antunes, acho. Contas de cabeça por alto calculei que ia pagar uns 130, 140 euros. Nisto pergunta ao empregado do balcão por uma edição de Heráldica que tinha visto na montra, mas que não encontrou exposta. Era uma edição composta por dois livros, grossos, de capa escura, ao preço de 75 euros cada. Levou dois exemplares de cada conjunto, um para ele, outro para ofereçer. Ao todo, naquele inicio de noite, o senhor de barba rala e cabelo grisalho, pagou pelos livros 437,76 euros! Pouco menos de metade do meu ordenado mensal... Atrás dele eu aguardava, com um exemplar de O Mel de Tonino Guerra e outro de O Bairro Judaico de Mário Rui de Oliveira, e senti-me tão pequenina...
Das duas uma, ou ele era um desses escritores que não tem espaço em casa para arrumar livros, ou sobrinho do Belmiro.

Nova Poesia Portuguesa II

José Miguel Silva




Nasceu em 1969


Livros editados:
O sino de areia, Gilgamesh, 1999
Ulisses já não mora aqui, & etc, 2002
Vista para um Pátio seguido de Desordem, Relógio Dágua, 2003




Contra os optimistas

Chamam destino ao rifão do acaso
e chamam à fraude boa fortuna.
Crêem no Batman e na Virgem Maria.
Duvidam do frio, não da polícia
e nunca dão crédito àquilo que vêem.

Reservam a tempo um lugar na geral,
põem o pé entre duas ciladas
e ficam a rir-se nas fotografias.
Sujam a roupa tal como nós, mas
mandam-na sempre a lavandarias
que sabem tratar dos casos difíceis.

Nunca dão ponto sem antes o nó,
mas fazem um laço por cima do nó.
Compram revistas de aval científico
em cujos artigos se prova o seguinte:
é quase impossível determinar
se é falsa uma lágrima ou se é verdadeira.

Depois, jantam em grupo, falam dinheiro,
guiam a vida por grandes veredas e ouvem
sininhos, muitos sininhos de música sacra.


Estava eu sentado

Estava eu no segundo passo da ditosa via sacra
da contracultura - charros, beatniks, Guy Debord -
quando dei comigo a ler um poeta conservador
e a pensar na beleza enigmática das suas imagens,

na mesa posta com autoridade; uma força
que me remetia para a precisão do mal e para
a contraposta redenção estética da vida.
Nessa altura conheci um rapaz que me dizia

as coisas mais desagradáveis, por exemplo:
"nem oito nem oitenta" ou "cuidado com
as vírgulas nos olhos". Foi ele que me ensinou
a não confundir a fome com a pressa de comer.

A condição natural do jovem lobo, dizia,
está na via sinuosa. As paredes de neve
cada vez mais alta, a vida retirada...


Mudar de casa

Para a Renata Botelho

É bom mudar de casa, de janela,
arrumar de outra maneira as ilusões,
tratar de coisas puras como tintas
e sofás, pôr ordem entre os livros
e a vida, simular a liberdade.
Parece-nos possível voltar a acreditar
na mão que nos estende um pé de salsa,
na pechincha da beleza, quando passa
no poente da razão.
Apetece cometer uma loucura,
comprar um telescópio, decorar
o canto nono dos Lusíadas,
subir umas escadas do avesso,
pensar que nunca mais teremos frio.


Não sei se são os trinta anos

Não sei o que se passa comigo:
cada vez me assusta mais a solidão.
Aos vinte anos, aos vinte cinco,
figurava o paraíso como um quarto vazio,
onde o silêncio de um Iivro ressoava
pela noite dentro. Protegia dos amigos
minhas horas, dos irmãos, dos apelos
do telefone. Como um cego de nascença,
estudava a escuridão. Sonhava-me
recluso numa ilha de fragais, rodeado ,
de trincheiras, distante de pracetas,
acenos, convites pra jantar.
O lamento era o meu hobby preferido.

Não sei se são os trinta anos, a chuva,
o sabor de mais um dia derrubado
nos transportes colectivos,
a queda maligna das primeiras folhas;
não sei o que é, talvez o teu amor
comece, pouco a pouco, a civilizar-me.
Agora, se chego a casa e tu não estás,
corro a pôr música, abro janelas,
agarro-me ao telefone, como um náufrago,
incapaz de suportar por um segundo
o terror emboscado debaixo da cama,
atrás das estantes, dentro de mim.


poemas retirados dos livros Ulisses já não mora aqui, & etc, 2002 e Vista para um Pátio seguido de Desordem, Relógio Dágua, 2003




março 04, 2004


Eu abortei!

Não o fiz, mas gostava de o poder fazer, e de o dizer, livremente, se essa fosse a minha escolha. Sem ter de aprender a falar castelhano.



As mãos de Eugénio





Os trabalhos da Mão

Começo a dar-me conta: a mão que escreve os versos envelheceu.
Deixou de amar as areias, as tardes de chuva miúda, o orvalho matinal dos cardos. Prefere agora as sílabas da sua aflição.
Sempre trabalhou mais que a sua irmã, um pouco mimada, um pouco preguiçosa, mais bonita.
A si coube sempre a tarefa mais dura: semear, colher, cozer, esfregar. Mas também acariciar, é certo. A exigência, o rigor, acabaram por fatiga-la.
O fim não pode tardar: oxalá tenha em conta a sua nobreza.





As mãos

Que tristeza tão inútil essas mãos
que nem sequer são flores
que se dêem:
abertas são apenas abandono,
fechadas são pálpebras imensas
carregadas de sono.

Pela noite adiante, com a morte na algibeira,
cada homem procura um rio para dormir,
e com os pés na lua ou num grão de areia
enrola-se no sono que lhe quer fugir.

Cada sonho morre às mãos doutro sonho.
Dez-réis de amor foram gastos a esperar.
O céu que nos promete um anjo bêbado
é um colchão sujo num quinto andar.


As Mãos e os Frutos

Passamos pelas coisas sem as ver,
gastos, como animais envelhecidos:
se alguém chama por nós não respondemos,
se alguém nos pede amor não estremecemos,
como frutos de sombra sem sabor,
vamos caindo ao chão, apodrecidos.





(Eros

Nunca o verão se demorava
assim nos lábios
e na água
- como podíamos morrer,
tão próximos
e nús e inocentes?)














Pormenor do Quadro "Eugénio de Andrade" de Isabel Maia Marques

Vamos...





"Em Pemba, existe uma praia onde gostaria de ter namorado. (...) é um lugar lindo para ler, dormir ou... fazer amor". Malangatana











março 03, 2004

No outro bolso


Para o Hugo e a Catarina

Trazer o mundo todo dentro do bolso
esquerdo do casaco, do lado de fora,
conhecê-lo por direito legislado, à borla,
morar na Mouffetard ou na Hippolyte
Maindrom Nº46, na rua 11 nº 3. No outro
bolso o bilhete para a Patagónia, o
improvável nome de Deus escrito a lápis
nas costas de um bilhete de cinema.
No lugar mais escuro do silêncio
no deserto atento da pele, espalhada
pelos quintais, pelos jardins deste
bairro judaico, em verso, pelas ruas
de Lisboa ou de Roma, tanto faz, a
luz mais clara de sempre, a dos olhos.
Nesta casa branca voltada para o cheiro
das ondas e das árvores, para o rumor
silêncioso dos pássaros, perceber que
se cresceu pelos gatos que partiram
e pelos amigos que se reconhecem.

Moleskine - Travel Book 1





Saímos de Florença às 8:38, debaixo de chuva. Na viagem de comboio passámos por Bolonha. A paisagem é verde, montanhosa e molhada (chove sempre). Ao longo do percurso passamos por inúmeros túneis, como se não houvesse mais nada, escuro e verde e chuva. Viajamos na "carroza" 7 e quase todos os nossos companehiros são estrangeiros, japoneses, americanos, espanhóis. Já falta pouco para chegar ao destino: Veneza.
Paramos ainda em Ferrara, Rovigo, Pádua e Mestre antes de chegarmos ao terminal de Santa Lucia, precisamente às 11:35. Ao descer as escadas da estação tem-se a primeira impressão dos canais: a água espessa, verde/azul escuro, quase cinzento, suja, repleta de vaporetos e outras embarcações mais pequenas. Tem-se também a visão daquilo que a cidade é: um imenso mar de gente, larga demais para tanta rua estreita.


Até ao hotel são cinco minutos a pé, não há automóveis aqui mas o ruído é tão intenso como se houvesse. Faz frio, e as malas pesam na urgência de as largarmos para explorar mais facilmente esta sujidade entranhada nos prédios, que encanta não sei bem como. (continua)

O dia de hoje


Hoje o dia vai ser longo, parece-me. Com todo este sol, frio, e este azul. Hoje vou confundi-lo com o azul do mar. Lá mais para a tarde, quando o azul se transformar em rosa, em vermelho e depois em preto.

março 02, 2004

O silêncio de tudo


O silêncio dos últimos dias trouxe-me da blogoesfera dois sítios que estão ainda no inicio mas que prometem. Um deles fica num dos locais mais bonitos da nossa costa e o outro fora deste mundo.
Descobri também que o Luís já sabe onde estava quase tudo.

março 01, 2004

Novas edições

Alguns já tinham sido anunciados, outros não. São de certeza as próximas compras:

Um quarto para si, Virginia Woolf , Relógio D'Água
Outros quartos, Outras vozes, Truman Capote, Relógio D'Água
Levadas, Manuel de Freitas, Assírio & Alvim
Bestiário, José Alberto Oliveira, Assírio & Alvim
Janelas altas, Philip Larkin, Cotovia